Outro tema do Coro das Vontades, Cinco Crimes Por Dia:

«A minha máquina de desejos não está sincronizada com a máquina do trabalho, não está sincronizada com a máquina dos bilhetes de autocarro, não está sincronizada com a máquina social do justo e do ilegal, produz dez mil comportamentos por dia, dez mil perguntas; é a única máquina pela qual tenho respeito, a única à qual peço para viver melhor, a minha sincronização é incontrolável, a minha complementaridade, o meu apaixonar-me, tudo o que faço e vivo vai para além da regra, espero por ti mesmo quando sei que não virás, e isto é extremamente irrazoável, olho o pôr-do-sol e o céu, e isto faz-me pensar que a minha vida e a minha cidade me pertencem, que não sou hóspede do vosso sistema, mas que sou roubado ao meu, e que este vosso modo de morrer cada dia, cientificamente, à frente e atrás da máquina da tristeza e da repressão, não tem possuidores, apenas possuídos, que não venderei a vida por uma fatia de pão, que destruirei as vossas máquinas, atravessarei a estrada fora das passadeiras, inventarei a cerveja e a erva e deixar-me-ei inventar por elas; inventar-me-ei a mim próprio, inventar-te-ei também a ti Maria pia, como o conseguirei, na linguagem que ainda nos pertence, que não é a da troca, o desejo não conhece troca, conhece apenas o roubo e a dádiva; dez crimes por dia, amor meu, e seremos nossos.» (E. Palandri, Um Piano nas Barricadas, Edições Antipáticas)

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